Por que, quando foi dado o Golpe de 1964, o Presidente Jango se encontrava no Rio de Janeiro - e não em Brasília?
Na tarde de 20 de abril de 1960 iniciaram as cerimônias de
inauguração com a entrega da chave da cidade para o presidente. À zero
hora do dia 21 de abril de 1960, durante uma missa solene, Brasília foi
declarada inaugurada em um clima de emoção e euforia, e o presidente e
vários entre o público foram às lágrimas. Pelas ruas os candangos
expressavam sua alegria. Às 8h da manhã foi dado o Toque de Alvorada
pela banda dos Fuzileiros navais e minutos depois Juscelino hasteou a bandeira nacional diante do Palácio do Planalto.
Em seguida Brasília iniciou suas atividades como capital, quando o
presidente recebeu os cumprimentos das delegações diplomáticas. Às
9h30min foram instalados os Três Poderes, às 10h15 min, na Catedral de Brasília ainda inacabada, o Núncio Apostólico instalou a Arquidiocese de Brasília, e às 11h30min foi realizada a primeira sessão solene do Congresso Nacional.
Ao fim da sessão Juscelino foi carregado nos ombros pelos parlamentares
como um herói. À tarde a população se reuniu no Eixo Rodoviário Sul
para assistir a um grande desfile militar, com a passagem do Fogo
Simbólico da Unidade Nacional. As comemorações se repetiram e só encerraram oficialmente na noite de 23 de abril, com a representação de uma alegoria escrita por Josué Montello,
que foi encenada com a participação de militares em parada, jovens da
sociedade carioca, tratores e um helicóptero descendo do céu, além de
inúmeros figurantes portando ferramentas de trabalho, personificando os
candangos. A tônica da peça, que narrava a fundação das três capitais
brasileiras, foi o contraste entre o abandono do velho e a adesão
decidida ao novo, resgatando figuras históricas e apontando para um
futuro brilhante, contra um cenário colorido por fogos de artifício e
diante do aplauso frenético da população.
As quadras 700, Asa Sul, em 1964. Fonte: Arquivo Público do Distrito Federal
Maquete do Plano Piloto, no Espaço Lúcio Costa
Panorâmica da cidade de Sobradinho, criada em 1960
Apesar de inaugurada, Brasília não estava pronta, nem todas as terras
haviam sido desapropriadas e a regularização fundiária não havia sido
concluída.
Grande número de edifícios importantes ainda era um esqueleto vazio,
outros sequer haviam saído do projeto, e a carência de habitações
finalizadas obrigou a muitos órgãos administrativos instalados no Rio
retardarem sua transferência, em vista da impossibilidade de acomodar
seus funcionários. As embaixadas
também não puderam funcionar imediatamente, algumas porém mandaram
representantes provisórios, circunstância causada pelo fato de o próprio Itamaraty ainda estar no Rio, só mudando para Brasília em 1970. Na prática, por algum tempo o Brasil teve duas capitais.
As obras continuaram pelo menos até a década de 1970, quando suas
principais estruturas foram ultimadas, mas a cidade nunca parou de
crescer e desde o início já ficara evidente que se deviam tomar medidas
para a preservação do plano original, sancionado-se em 1960 a Lei
Santiago Dantas, a primeira lei orgânica do Distrito Federal, que
obrigava qualquer modificação na cidade ser autorizada previamente pelo
Senado, fixando um modelo urbano que se revelou socialmente excludente.
As mesmas dificuldades por que passavam os candangos no ambiente de
trabalho se refletiram no momento da distribuição de lotes e
apartamentos. A região do Distrito Federal fora comprada pela República
ao preço de dois centavos por metro quadrado, mas se venderam as terras
por quinhentos cruzeiros o metro quadrado. Em 1960 todos os lotes da Asa Norte já estavam vendidos ou reservados, e os interessados só podiam adquiri-los de terceiros, com um ágio
de duzentos a trezentos mil cruzeiros. Se o interessado fosse um
deputado, senador ou jornalista, a Novacap fornecia lotes livres a um
preço razoável e sem ágio. Para área das mansões próximas ao Lago Paranoá,
a zona nobre da cidade, o custo estava em trinta cruzeiros ao metro,
mas apenas para clientes selecionados da elite, em especial favor da
Presidência da República, enquanto que na zona residencial comum o preço
subia para quinhentos cruzeiros.
Outras discriminações diziam respeito ao grau de ligação com o governo
federal que mantinham funcionários de categoria idêntica. Essa realidade
contradizia os ideais esquerdistas
de Niemeyer e Costa, para quem, na interpretação de Holston, Brasília
deveria ser um exemplo de integração e nivelamento social, uma cidade
que iria transformar a sociedade brasileira através de um movimento
social pacífico. Segundo o plano original, todos os futuros habitantes
de Brasília viveriam em moradias do mesmo tipo em zonas comunitárias
mais ou menos autossuficientes, as superquadras. Gradações na hierarquia
social, inegáveis, seriam expressas em variações discretas nas
dimensões dos domicílios e na qualidade dos materiais e acabamentos. A
própria organização do traçado urbano era prevista para favorecer ao
máximo a integração de todos e possibilitar a todos um desfrute
igualitário do espaço social, redefinindo, segundo princípios do Congresso Interncional da Arquitetura Moderna
(CIAM), aquelas que eram consideradas as funções-chave da vida urbana -
trabalho, moradia, lazer e tráfego -, assegurando a primazia do
coletivo sobre o individual e evitando os problemas do desenvolvimento
urbano capitalista.
Toda essa ideologia não se concretizou, a elite se apossou dos
melhores locais e expulsou a classe baixa para as periferias, e a
integração, como disse Couto, não passou de uma utopia.
Cerca de 90% dos pioneiros pertenciam ao estrato social mais baixo e,
na prática, "brasilienses" eram apenas os que viviam no Plano Piloto.
Enquanto Juscelino chamava os candangos de heróis, em pouco tempo sua
condição passou à pura e simples marginalidade. A segregação era ainda
mais enfatizada pela existência de um cinturão verde em torno do Plano
Piloto, isolando a área das periferias, e pela quase impossibilidade de
as cidades-satélite se desenvolverem independentemente da aprovação
federal. Seu crescimento era estorvado por pesada burocracia,
por legislação que pretendia preservar as características do Plano
Piloto e arredores, pela inconsistência nas demarcações dos lotes,
rápida saturação de áreas autorizadas pela Novacap, especulação imobiliária,
fraudes no sistema e várias restrições ligadas à efetivação da posse da
terra. Em muitos casos a pressão habitacional sobre os operários os
levou a se apossarem de lotes ilegalmente, e sua situação permaneceu
irregular por longo tempo, como foi o caso da formação da Vila Matias e
da Vila Sara Kubitschek.
Depois da saída de Juscelino do governo o plano desenvolvimentista começou a dar sinais de rápido esgotamento e a dívida pública se avolumara enormemente, com elevada inflação. As denúncias contra os gastos governamentais se amiudavam, a questão da reforma agrária
e a luta pelos direitos trabalhistas ganhavam espaço, questionava-se a
legitimidade das instituições, os sindicatos se mobilizavam em repetidas greves. A
sociedade se inquietava e se dividia entre conservadores e radicais, e a
solução armada para crise era vislumbrada por ambos os lados. Em poucos
anos o clima político passou da plena democracia para a confusão e a
instabilidade. Em Brasília a crise econômica e o desemprego eram
especialmente sentidos, e temeu-se depredações e tumultos populares.
Para aliviar a pressão o governo iniciou um programa de transferência
populacional. Aviões da Força Aérea
levaram inúmeros candangos desempregados para o sul do país para
trabalharem na agricultura, e outros tantos, com suas famílias,
receberam passagens de volta para suas regiões de origem. Ao mesmo
tempo, aumentavam os rumores sobre a volta da capital para o Rio. Em
1964 o presidente João Goulart abandonou a capital e logo renunciou durante o Golpe de 1964, quando os militares assumiram o poder sob os argumentos de proteger a soberania nacional, combater a corrupção e evitar o "perigo comunista", instalando um regime autoritário e repressor.
In: http://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_de_Bras%C3%ADlia
Nenhum comentário:
Postar um comentário